O quanto de criação intelectual existe diante de um fato a ponto de parecer que existe um problema? O quanto de emoções, sensações e pensamentos surgem diante de uma situação? Quantas interpretações, suposições e projeções?
Somos completamente condicionados pela memória. É ela que qualifica os fatos de acordo com nossas experiências (que também são interpretações nossas), gostos e aversões. Estamos o tempo todo querendo evitar as situações desagradáveis.
É assim que surge o problema: queremos alterar o que está acontecendo, o fato.
O verdadeiro é o que está acontecendo, o fato.
Não é a interpretação, nem o julgamento, nem a memória, nem o condicionamento, não é uma sensação, nem o entendimento das coisas. É o fato. Ao olhar um dia nublado, alguém vai dizer que dia chato enquanto outro dirá que dia gostoso. Qual é o fato? O dia está nublado.
A pessoa que é capaz de perceber o que está pensando e sentindo diante dos fatos, está vendo a realidade e o quanto de interpretação, emoção, sensação, a mente dela é capaz de gerar de acordo com o acúmulo de memórias, pensamentos, conhecimentos, interpretações e julgamentos.
Tudo isso é apenas construção conceitual e não existe de fato.
Quando a pessoa é incapaz de encarar o que está se passando nela, cria ilusões para escapar disso. Se a pessoa não quer ou tem medo de enfrentar o que está acontecendo, essa mesma fuga cria a ilusão, a fantasia, e a coloca longe do que existe.
As ilusões podem acontecer quando existe um movimento que nos afasta do fato, daquilo que está ocorrendo, daquilo que é verdadeiro. Ao compreender “o que é”, quem julga não é mais a opinião pessoal, mas a observação verdadeira. É impossível observar o que está acontecendo se a crença ou condicionamento qualifica a observação; isso seria evitar a compreensão “daquilo que é”.
Se a pessoa olhasse para o que está acontecendo, evitaria toda a forma de ilusão.
Alguém pode fazer isso? A pessoa pode observar verdadeiramente a própria dependência, seja ela a dependência de uma pessoa, de uma crença, de um ideal ou de alguma experiência que lhe provocou uma grande dose de excitação?
A dependência, inevitavelmente, cria a ilusão.
A mente que não vive mais criando ilusões, que não formula hipóteses, que não tem alucinações, que não quer aferrar-se a uma experiência, é a mente que traz ordem para si mesma.
Se a pessoa puder rumar para dentro de si, indo de um fato a outro, ela descobrirá aquilo que está além da ilusão, além dos conceitos, condicionamentos, pensamentos e personagens. Perceberá que tudo isso foi construído, inventado, alimentado, cristalizado como memórias e conhecimentos; tudo isso é falso, assim como o dia nublado ser chato ou gostoso. São apenas conceitos intelectuais que e se alteram o tempo todo de acordo com o intérprete.
Por Deneli Rodriguez