Pense na última vez em que você falhou ou cometeu um erro grave. Você ainda se envergonha e se repreende por ter sido tão tolo ou egoísta?
Você tende a se sentir sozinho nessa falha, como se fosse a única pessoa que cometeu um erro? Ou você aceita que o erro faz parte do ser humano e tenta falar consigo mesmo com carinho e ternura?
Para muitas pessoas, ser crítico consigo mesmo é algo natural. Na verdade, podemos até nos orgulhar de sermos duros conosco como um sinal de nossa ambição de melhorar.
Mas uma grande quantidade de pesquisas mostra que a autocrítica costuma ser contraproducente. Além de aumentar nossos níveis de infelicidade e estresse, pode aumentar a procrastinação e nos tornar ainda menos capazes de atingir nossos objetivos no futuro.
Em vez de nos castigarmos, devemos praticar a autocompaixão — nos perdoar mais por nossos erros e fazer um esforço deliberado para cuidar de nós mesmos em momentos de decepção ou vergonha.
“A maioria de nós tem um bom amigo em nossas vidas, que nos apoia incondicionalmente”, diz Kristin Neff, professora associada de psicologia educacional da Universidade do Texas, em Austin, que foi pioneira nessa pesquisa.
“A autocompaixão é aprender a ser um amigo caloroso e compreensivo consigo mesmo.”
Se você for um defensor do cinismo, pode inicialmente se opor a essa ideia.
Como a comediante britânica Ruby Wax escreveu no livro dela sobre atenção plena: “Quando ouço que as pessoas são amáveis consigo mesmas, imagino o pessoal acendendo velas perfumadas em seus banhos e afundando em uma banheira de leite de iaque do Himalaia”.
No entanto, as evidências científicas sugerem que nos tratarmos bem pode aumentar nossa resiliência emocional e melhorar nossa saúde, bem-estar e produtividade.
É importante ressaltar que também nos ajuda a aprender com os erros que causaram nosso desconforto em primeiro lugar.
Confie na autocompaixão, não na autoestima
A pesquisa de Neff foi inspirada numa crise pessoal. No final dos anos 1990, ela estava passando por um divórcio doloroso. Procurando uma maneira de lidar com o estresse, ela se matriculou em aulas de meditação em um centro budista local.
A prática da atenção plena trouxe um alívio, mas foram seus ensinamentos sobre compaixão, em particular a necessidade de direcionar essa bondade para si mesma, que causou mais conforto.
Superficialmente, a autocompaixão pode parecer com o conceito de “auto-estima”, que se refere a quanto valorizamos a nós mesmos e se nos vemos sob uma perspectiva positiva.
Os questionários para medir a auto-estima dos participantes pedem que eles avaliem afirmações como: “Sinto que sou uma pessoa valiosa, pelo menos no mesmo nível que as outras.”
Infelizmente, isso geralmente é acompanhado por um senso de competição e pode facilmente resultar em um tipo frágil de narcisismo que desmorona diante de um possível fracasso.
“A autoestima depende do sucesso e das pessoas gostarem de você, então não é muito estável. Você poderia tê-la num dia bom, mas perdê-la em um dia ruim”, diz Neff.
Muitas pessoas com elevada auto-estima recorrem à agressão e bullying quando a sua confiança é ameaçada.
Neff percebeu que cultivar a autocompaixão pode ajudar a evitar essas armadilhas, de modo que você pode se levantar quando estiver se sentindo magoado ou envergonhado, sem derrubar outras pessoas ao longo do caminho.
Ela então decidiu projetar uma escala psicológica em que os participantes tivessem que classificar uma série de afirmações em uma escala de 1 (quase nunca) a 5 (quase sempre), como:
• Tento ser gentil comigo mesmo quando sinto uma dor emocional
• Tento ver minhas falhas como parte da condição humana
• Quando algo doloroso acontece, tento ter uma visão equilibrada da situação
• Eu desaprovo e julgo minhas próprias deficiências e insuficiências
• Quando penso em minhas deficiências, tendo a me sentir mais separado e isolado do resto do mundo
• Quando me sinto deprimido, tendo a ficar obcecado e me fixar em tudo o que está errado.
Quanto mais você concorda com as três primeiras afirmações e quanto menos concorda com as demais, maior é a sua autocompaixão.
Os primeiros estudos de Neff examinaram como a autocompaixão estava relacionada à saúde mental e ao bem-estar geral das pessoas.
Ao entrevistar centenas de estudantes de graduação, ela descobriu que a característica estava negativamente correlacionada com relatos de depressão e ansiedade, e positivamente correlacionada com a satisfação geral com a vida.
É importante ressaltar que este estudo também confirmou que a autocompaixão era diferente da autoestima. Em outras palavras, pode haver alguém com um senso geral de superioridade, que, no entanto, acha muito difícil se perdoar por falhas percebidas. Uma combinação longe de ser ideal.
Pesquisas posteriores confirmaram essas descobertas em amostras mais diversas, de estudantes do ensino médio a veteranos americanos com risco de suicídio.
Por David Robson