Fotógrafo Brasileiro Vence Prêmio Internacional com Série que Celebra Religiões de Matriz Africana

Em um momento histórico para a valorização das tradições afro-brasileiras, o fotógrafo fluminense Gui Christ acaba de conquistar o maior prêmio da fotografia mundial com sua série “M’Kumba“, que celebra a riqueza cultural e espiritual das religiões de matriz africana no Brasil enquanto combate o racismo religioso. O artista foi consagrado como o melhor fotógrafo do ano na categoria Retratos do Sony World Photography Awards 2025, uma das premiações mais prestigiadas do mundo, que recebeu mais de 400 mil imagens enviadas por artistas de mais de 200 países.

A Força da Ancestralidade Africana Revelada em Imagens

A série premiada apresenta retratos poderosos de praticantes de religiões como o Candomblé e a Umbanda em diversas regiões do Brasil. Através de uma estética que une elementos simbólicos e documentais, as fotografias capturam a essência da espiritualidade afro-brasileira, celebrando a resiliência dessas comunidades que enfrentam séculos de racismo e intolerância religiosa.
O próprio nome do projeto carrega um significado profundo. Como explica o fotógrafo, “‘Kumba’, na língua quicongo, falada na região centro-africana, quer dizer ‘curandeiro’, ‘senhor da palavra’, ‘homem sábio’; e ‘ma’ é ‘coletivo’. Então ‘macumba’ é o encontro de curandeiros, pessoas que reafirmam sua fé em um país em que os praticantes das religiões de matriz afro sofrem um ataque a cada três dias”.
Esta explicação etimológica ressignifica um termo frequentemente usado de forma pejorativa, revelando sua verdadeira origem e importância cultural. O trabalho de Christ não apenas documenta, mas também educa e desconstrói preconceitos enraizados na sociedade brasileira.
'Celebração de Yemanjá': imagem faz parte da série 'M'kumba', de Gui Christ

‘Celebração de Yemanjá’: imagem faz parte da série ‘M’kumba’, de Gui Christ

Uma Jornada Pessoal de Fé e Resistência

Filho de Ogum e Iemanjá, Gui Christ não é apenas um observador externo das tradições que retrata. Ele é membro de uma comunidade tradicional Nagô Egbá e também praticante de Umbanda, dedicando-se há quase seis anos à documentação fotográfica das religiões afro-brasileiras.
“Minha motivação cresceu após ter sido vítima de uma tentativa de atropelamento por trajar roupas litúrgicas, episódio que me fez compreender a urgência de transformar essa violência em denúncia visual e afirmação cultural”, revela o fotógrafo, demonstrando como sua arte surge de uma experiência pessoal de discriminação.
Christ costuma dizer que virou “macumbeiro por causa da fotografia” ou que virou “fotógrafo por causa da macumba”, evidenciando a conexão profunda entre sua espiritualidade e sua expressão artística. “Tenho dupla pertença. Na Umbanda, há o culto aos ancestrais (influência bantu); no Candomblé, temos o culto a um orixá divinizado. Essa dupla pertença e meu processo fotográfico me permitiram entender essa diversidade e desconstruir o racismo”, explica.

Um Prêmio para Toda a Comunidade Afro-Brasileira

Ao receber o prêmio, o fotógrafo fez questão de dedicá-lo não apenas a si mesmo, mas a toda a comunidade que representa. “Ogunhê! Toda vitória pertence a Ogun. Pertence à cultura, às religiões e ao povo afro-brasileiro. Dedico essa conquista a Èṣù, Ògún, Òṣóòsì, Ọbalúayé, a todos os orixás, inquices, voduns, encantados e entidades ancestrais cultuadas em nossos terreiros”, declarou.
Christ enfatizou que a vitória não é apenas sua, mas “de todos os mais de 4 milhões de africanos trazidos à força ao Brasil, que perderam suas liberdades e tiveram suas espiritualidades combatidas por séculos”. E acrescentou que essa vitória “também é de seus descendentes, que há mais de 400 anos, nos quilombos e nas comunidades de axé, mantêm vivos os legados de seus ancestrais, superando os preconceitos e as violências que o racismo ainda insiste em causar”.
M'kumba

‘Pipoca para remover as doenças’: imagem faz parte da série ‘M’kumba’ Foto: Gui Christ

A Importância da Representatividade para as Religiões de Matriz Africana

O reconhecimento internacional do trabalho de Gui Christ representa um marco significativo para a visibilidade positiva das religiões de matriz africana. Em um contexto onde terreiros e praticantes ainda enfrentam discriminação e violência, a premiação traz luz à beleza, profundidade e legitimidade dessas tradições espirituais.
As religiões como o Candomblé e a Umbanda são parte fundamental do patrimônio cultural brasileiro, preservando conhecimentos ancestrais sobre ervas medicinais, rituais de cura, música, dança e filosofias de vida que valorizam a conexão com a natureza e o respeito aos mais velhos. Ao retratar praticantes dessas religiões com dignidade e respeito, Christ contribui para a desconstrução de estereótipos negativos e para a valorização da diversidade religiosa no Brasil.

Um Chamado à Reflexão sobre Intolerância Religiosa

O trabalho premiado de Gui Christ nos convida a refletir sobre a persistência do racismo religioso no Brasil e a necessidade urgente de combatê-lo. A intolerância contra religiões de matriz africana não é apenas uma questão religiosa, mas também racial, revelando as profundas raízes do racismo estrutural em nossa sociedade.
Segundo dados recentes, os terreiros de Candomblé e Umbanda continuam sendo alvos frequentes de ataques, demonstrando que, apesar dos avanços na legislação que protege a liberdade religiosa, ainda há um longo caminho a percorrer para garantir o respeito pleno a essas tradições.
A série “M’Kumba” surge, portanto, como uma poderosa ferramenta de resistência cultural e espiritual, utilizando a arte para promover o diálogo, a compreensão e o respeito mútuo entre diferentes tradições religiosas.

Conclusão: Arte como Instrumento de Transformação Social

A conquista de Gui Christ no Sony World Photography Awards 2025 transcende o campo artístico, tornando-se um símbolo de resistência e afirmação cultural para as comunidades de terreiro em todo o Brasil. Seu trabalho demonstra como a fotografia pode ser um instrumento poderoso de transformação social, capaz de desafiar preconceitos, educar e inspirar mudanças de perspectiva.
Em um momento em que o Brasil ainda luta para reconhecer e valorizar plenamente sua herança africana, a premiação internacional de uma série dedicada às religiões de matriz africana representa um passo importante na direção de uma sociedade mais justa e respeitosa com sua diversidade cultural e religiosa.
Para conhecer mais sobre o trabalho de Gui Christ e a série premiada “M’Kumba”, visite seu site oficial

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